Take me Somewhere nice

Blog de um jornalista viciado em música e com paixões variáveis. Pinceladas de cinema, futebol e São Paulo podem aparecer sem aviso.

terça-feira, fevereiro 27, 2007

Maria Lúcia se Arrependeu depois

Li isso aqui no site do Rubens Ewald (Cinemacomrubens.com.br):

A canção Faroeste Caboclo, que a banda brasiliense Legião Urbana gravou em meados da década de 80, vai virar filme, pelas mãos do autor Paulo Lins (de Cidade de Deus ). Na música é relatada a saga de João de Santo Cristo, que viaja da Bahia para Brasília em busca de oportunidades e acaba se tornando traficante de drogas. Esse projeto se junta a outros dois ligados à banda liderada por Renato Russo: Religião Urbana e Eduardo e Mônica (este também inspirado em uma música do grupo).

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Outro dia desses a Malu me repreendeu por citar uma frase do Renato Russo pra tudo.
- Ele tava indo pra Brasília...
- Com o Diabo ter?

Intérprete meia-boca (se fosse um cantor lírico, ok), banda fajuta (Bonfá foi, até 96, um dos piores bateristas do nosso rock), Renato Russo sobreviveu como letrista, num país que, embriagado por Chicos e companhia, a letra era TUDO. Sobraram algumas poucas músicas interessantes, que rendem até boas versões. Mas no geral o som dele soa extremamente datado. O curioso é que Renato foi um emo de cabelo ruim, sem franjinha, antes do tempo. Um gótico que não visitava cemitérios, um gay que preferia ser bravo a soltar a franga.

Para nós brasilienses ele é uma coisa meio lendária até. O famosíssimo DF Medieval diz que DAS ANTIGAS, ele era semi-deus, e era comum ouvir de amantes:
- Você me ama mesmo.
- Sim
- Jura?
- Juro por Renato.

E "Pelas batidas de Bonfá" também era expressão fácil nas quebradas.Vai ver que é assim mesmo e vai ser assim pra sempre.

Ah! Eu já sabia!

Até que eu não fui mal nas minhas previsões. Se bem que, fora o Melhor Filme, a coisa já tava meio cantada, certo? Mas a meu favor conta que assim que saí do cinema em Os Infiltrados disse que o filme ganharia 5 Oscar - Leo Di Caprio não levou, nem concorreu, uma pena. Mesma coisa quando eu vi Labirinto do Fauno na Mostra de São Paulo. A galera aplaudiu, e eu saí dizendo que ele seria indicado fora da categoria de Filme Estrangeiro. Aliás, o alemão ganhou aparentemente porque passou bem recentemente lá nos EUA, e tava com um bom lobby para exibição - a Sony Classics lançou nos EUA e garantiu que todos os votantes vissem.

E Iñarritù é gênio, Babel é um filme muito bom, mas ele não é assim "automaticamente bom". O filme demora a engrenar e os pontos de contato que ligam todas as histórias são meio forçados. As três histórias separadamente são interessantes, tem uns lances bem sutis, que você não pega assim logo de cara. As atuações são primorosas, especialmente da japa-surda e da mexicana, ambas indicadas ao Oscar. Mas acho que é o menos bom dos 3 filmes do mexicano, que com certeza vai ganhar pelo menos um Oscar ainda, não fiquem tristes.

sexta-feira, fevereiro 23, 2007


Acho que foi a primeira vez na minha vida que vi todos os filmes que concorrem ao Oscar de melhor filme, além de uma cabeçada dos outros. E foi um ano excelente para cinéfilos all around. Qualquer um poderia ganhar que não seria um absurdo. Aos meus parpites:









Filme:
Os Infiltrados
-- Pode ser também... Babel




Diretor:
Martin Scorcese (Infiltrados)
... Clint Eastwood (Cartas de Iwo Jima)



Ator:
Forest Withaker (O Último Rei da Escócia)
... Leonardo Di Caprio, (Diamante de Sangue)



Atriz:
Helen Mirren (A Rainha)
... Não há



Ator coadjuvante:
Eddie Murphy (Dreamgirls)
... Alan Arkin (Pequena Miss Sunshine)



Atriz Coadjuvante:
Cate Blanchet, Judi Dench (Notas de um Escândalo)
... Jennifer Hudson (Dreamgirls)



Roteiro Original:
Babel
... Pequena Miss Sunshine




Roteiro Adaptado:
Os Infiltrados
... Borat




Fotografia:
Filhos da Esperança
... O Labirinto do Fauno




Filme Estrangeiro:
Labirinto do Fauno (México)
... A Vida dos outros (Alemanha)



Edição:
Babel
... Vôo 93




Documentário:
Uma Verdade Inconveniente
... Não há



Direção de Arte:
O Labirinto do Fauno
... Dreamgirls


Notas gerais: Não haverá O Grande Vencedor, os prêmios serão pulverizados. O filme que concorre a mais estatuetas (Dreamgirls, com 8) leva no máximo 4. Possíveis injustiçados: Cartas de Iwo Jima, obra-prima de Clint Eastwood que em outros anos ganharia o prêmio de Melhor Filme e Filhos da Esperança, outro filme genial, que poderia ganhar mais Oscars mas é um pouco "difícil". Difícil haver azarões com filmes de tanta qualidade, o único possível é Pequena Miss Sunshine, que aos poucos ganha a simpatia da Academia.
Se eu errar tudo podem ter certeza que a ACADEMIA que está equivocada. :)

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Super!

Ok, em primeiro lugar, eu não sou isento, de forma alguma, pra dar essa opinião. Mas a Superinteressante está cada vez melhor. O editorial da edição anterior, contra o “jornalismo bunda-mole”, já tinha dado o recado: há muito lixo nas bancas e redações, pessoas que fazem jornalismo apenas pra preencher espaço.

Hoje sobram informações por aí, e a Super serve menos pra falar de novidades (só se for antecipação de novidades), mais pra dar ferramentas pras pessoas pensarem o mundo com bons filtros, refletirem sobre a realidade, discutirem assuntos que nem seria pauta de bar e de repente se tornam excelente comida pro cérebro. Na edição que está nas bancas (depois da capa do Lost), tem um negocinho legal que eu compilei do Edge.org, “5 Razões pra ficar Otimista”. Antes de entrar na revista já tinha abastecido ótimas discussões com meu pai, minha mãe, colegas de trabalho, amigos no bar...

Ler a Super é cada vez mais legal, e escrever pra ela sempre foi um prazer. Também tenho orgulho das pessoas que escrevem pra lá, que não são exatamente amigos de trabalho, já que sou freela apenas, mas dos melhores coleguinhas, jornalisticamente falando mesmo. Hoje teve um artigo na Folha do Leandro Narloch, um dos editores, intitulado “A Beija-flor mente sobre a África”. Acompanhe:

“Será que entendi direito? Estariam os autores do samba chamando a África de ‘mãe da liberdade’? Será que eles não sabem que o tráfico de escravos começou muito antes de os europeus chegarem lá, que a escravidão foi extremamente lucrativa para reis africanos e que foram eles os que mais debateram contra a abolição?

(...)

“É bom saber que a Beija-Flor não caiu na vitimologia barata, comum em letras de rap, e preferiu enaltecer a riqueza da África. Só faltou dizer a origem dessa riqueza: a escravidão. Por que nenhuma delas homenageia a luz que veio da Inglaterra, sem a qual até hoje os africanos achariam OK comprar gente? Em vez disso, a Beija-Flor preferiu louvar reis que traficavam escravos.”

Temos de ter uma visão menos Sauron-Gandalf do mundo, maniqueísta. O negócio é mais complicado que parece. Mas se você se der o trabalho de ir atrás, é bem mais interessante.

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terça-feira, fevereiro 13, 2007

João do Rio

O que as pessoas do Rio de Janeiro vão fazer agora?

João, 6 anos, não tinha nada a ver com os problemas da cidade, uma vez chamada de Maravilhosa. E esse é o ponto: ele não tinha absolutamente nada a ver com a história. Não era uma pessoa rica, era de uma família simples e, um detalhe importante, era uma criança. Isso fez a Veja escrever micro-editoriais dentro da matéria sobre o caso. Ela clama:

"O martírio público do menino João Hélio está destravando a língua de dezenas de explicadores (intelectuais). São os mesmos que passaram a mão na cabeça dos 'meus guris' que desciam ao asfalto para subtrair um pouco do muito que os ricos tinham e, assim, sustentar a mãe no morro. Chega de romancear o criminoso, de culp-ar abstrações como a 'violência', o 'neoliberalismo', o 'descaso da classe média'..."

A matéria segue dizendo que não há ONGs pra ajudar a família de João, não há missas de ação social que tenham a classe média encolhida em medo como alvo das bênçãos. A Veja acerta em expressar de maneira firme a indignação, é hora de dar um tempo nas "explicações" da violência e começar a diminuí-la. O problema é que a Veja vê a história muito como uma questão de segurança pública e legislação, e nós, infelizmente, não temos estrutura para implantar as reformas. Ok, vamos prender mais gente: mas onde elas vão ficar? Os depósitos humanos vão punir a pessoa, ok, mas deixemos os assassinos e estupradores 20 anos na cadeia, ao invés de 5, e o que vai ser dele quando eles sairem? Alguém com sangue nos olhos, que se vingará da sociedade, que tirou a sua vida. Funciona?

Sou "quase" imparcial, mas eu acredito que a violência no Rio (50% maior que em São Paulo, para comparação) tem como enorme culpada a sociedade carioca. Estive lá no fim de ano, quando estouraram aqueles atentados (8 pessoas morrendo carbonizadas no ônibus, homem levando tiro quando foi prestar queixa na delegacia, etc) e fiquei impressionado. Não pelos atentados apenas (o PCC esteve aqui, afinal), mas pela absoluta passividade dos cariocas. Lembro que tomei a decisão de não descer à praia em Copacabana, nem ir pras comemorações de Ipanema, no Réveillon. Não havia o que comemorar. Esse eterno "vamos nos acabar pra esquecer dos problemas" causa um enorme problema. Enquanto tiver o assassinato de um João e o carnaval duas semanas depois, estamos perdidos.

Eu tô de greve com o Rio. O que me incomoda é essa contínua empáfia dos cariocas de achar que é o "melhor lugar do mundo", "Cidade Maravilhosa". Aliás, esse termo tem de ser terminantemente proibido, até segunda ordem A Suzane von Richthofen "continua linda" depois do que fez? Onde eu quero chegar com isso? Na prática, problemas só são combatidos quando eles são vistos como grandes problemas. No Rio, as pessoas acham que faz parte do pacote, a violência é um inconveniente, mas "não há lugar melhor pra se viver"...

Não.

Isso não significa que eles têm de ficar (mais) amedrontados. Mas têm de usar o na maioria das vezes nefasto bairrismo para entender que é a sociedade deles que está em jogo, a cidade querida que está ficando em colapso, e que eles precisam fazer alguma coisa, qualquer coisa. De deixar de achar engraçada uma malandragem qualquer a não dar esmola, a eleger pessoas mais comprometidas com o Rio, não sei. Há o que fazer. Fui ao Rio minha vida inteira, sempre adorei o lugar e espero voltar lá, quando o povo tomar conta da cidade.

Ontem eu passava aqui na Rua Rocha, e num parquinho estava sendo celebrada uma missa, muitas crianças em volta. O padre falava em linguagem bem clara pra atingir a molecada, que, veja só, prestava atenção. Descobri que todo dia 12 tem missa no parquinho, achei interessante. Já estava indo embora quando o padre falou que a missa era dedicada a duas pessoas: ao "menino João" - "os homens malvados mataram ele"; e ao "vovô que salvou o netinho da cobra". Bom que as crianças vejam isso desde cedo. A realidade é cruel, e eles precisam saber. Mas precisam ouvir também exemplos de pessoas com gestos simples fazem a sua parte.

Amém.