Take me Somewhere nice

Blog de um jornalista viciado em música e com paixões variáveis. Pinceladas de cinema, futebol e São Paulo podem aparecer sem aviso.

terça-feira, abril 29, 2008

O e-mail que eu (ainda) não mandei para o povo de Brasília

Queridíssimos,

Long time no see, ou sem notícias detalhadas há tempos. Pois então, continuo em São Paulo e como comprei um apê aqui no fim do ano passado acho que não volto tão cedo – algumas passagens relâmpagos virão. Este mês fez exatamente um ano que eu larguei o Sebrae e passei a viver só de freelas, e a coisa tem dado bizarramente certo. Mais recentemente diminuí bem o leque de coisas que faço, não preciso me matar pra pegar uma pagininha aqui ou ali, dá pra escrever sobre o que eu gosto na Vip (essa de abril tem 4 minhas, sobre videogame, gastronomia e música), Superinteressante (agora só coisas maiores, to há 1 mês e meio pesquisando sobre discos-voadores para uma matéria de 10 páginas) e a Mundo Estranho, onde o povo agora resolveu me dar muitas pautas. Participo de um programa de rádio aqui da Eldorado (Pesquisa Brasil, dá pra me ouvir aqui) comentando sobre genômica – tenho de assistir algumas palestras fenomenais, com prêmios Nobel e tal, e contar pras pessoas sobre as idéias dos caras. Fantástico! Meu blog tem ido bem na audiência e em abril mudou o nome para “Próxima Fase”, nada mais apropriado. Ali escrevo absolutamente o que quiser sobre videogames, e com alguma repercussão – a Electronic Arts me procurou espontaneamente para me dar jogos para testar (Viva o jabá!), pude entrevistar executivo da Sony com a credencial de “blogueiro”. Hoje dei uma entrevista por telefone pra Radio France, fui apresentado como “jornalista especialista em videogames”, fiquei 5 minutos comentando sobre o lançamento de GTA IV. É o sonho nerd realizado, amiguinhos, não fui indicado por nenhum amigo, mas pela busca no Google!

Foi mal a autopromoção mega. É que realmente tô muito feliz aqui com a vida profissional (teve o Prêmio Abril de Jornalismo, não ganhei, mas a indicação já foi bastantão e a festa maravilhosa), e queria compartilhar com as pessoas daí. Não que eu ganhe muito dinheiro, bem possivelmente estaria melhor financeiramente em Brasília. Mas dinheiro não é tudo, mas é 100%, como diria Falcão. Aliás, foi engraçado que um calouro do Curso Abril tava conversando um dia comigo e perguntou: “mas realmente dá pra viver bem de freelas?”. Eu falei “depende do que você chama de viver bem, depende do valor que você dá ao dinheiro”. Ele riu, acho que ali teve certeza que não, não dava. Mas o lance é o seguinte: essa minha felicidade tem de entrar na equação de salário. Eu ganho um X variável por mês + adicional de trabalhar a hora que quiser + adicional de poder ir ao cinema à tarde + bonificação por jogar videogames for a living + D.A.S. de poder escrever sobre coisas que gosto, do jeito que acho fera. Toda essa última parte da equação é, digamos, não-monetária. Mas, como diz o Chris Anderson, só agora as pessoas estão notando que um trabalho não deve ser remunerado de maneira apenas monetária. Veja o caso da Wikipédia, ou o Banco do Tempo que minha irmã descobriu em Barcelona.

Então, sei lá, fiquei ensaiando esse meu e-mail muitas vezes – e já falei ele quase integralmente para algumas pessoas – desde as últimas vezes que estive em Brasília. Vocês dão licença pra uma sessão observações-aleatórias-auto-ajuda-pedante? O pedante é por vocês, a mensagem é com carinho.

As pessoas que recebem este e-mail têm, na média, a minha idade: 27. E com 27 você ta mais perto dos 30, aos olhos dos nossos pais (que à essa época já deveriam estar casados e com filhos) já passou da hora de você ter um emprego estável e no mínimo pensar em constituir família. E toda vez que eu volto à minha cidade (não é Rio Branco, para ficar claro) eu tenho a impressão que as pessoas estão repetindo esse script, deixando sonhos pra lá. Quando ainda tava no JB, no longínquo 2003/4 o papo dominante era o tanto que neguinho tava cansado de ralação, como vida de jornalista era difícil e não pagava bem. Mas ainda havia ali um monte de “o que eu quero ser quando crescer”. Os 2 ou 3 anos seguintes (com alguma rebarba agora) envolveram concursos, até a lei 8.666 passou por mesa de bar. É óbvio, o teto para jornalista em Brasília é limitado e as melhores condições de emprego, financeiramente falando, estavam (estão) no funcionalismo.

Não julgo ninguém, pelamorrrrr...

Mas aí eu volto no fim do ano passado, este ano. Boa parte do amigos entrou em concursos ou está circulando pelo governo de alguma maneira. O papo agora é juntar dinheiro, comprar um lote (normalmente sem sair da casa dos pais, o que é curioso), ou um apê em Águas Claras – quem tem muito cacife, Noroeste.

Mas já? Não to dizendo que o serviço público não pode ser gratificante e interessante (Gustavo, estou olhando pra você), ou que ter a oportunidade de comprar uma casa, especialmente com alguém que você quer ficar um bom tempo da vida (FelipeLu, alô) não seja bem legal e desejável. Cada um se satisfaz com o que quiser, da forma que quiser. Aliás, essa idéia quase hedonista de satisfação absoluta no trabalho é bem recente, e ser solteiro nunca foi uma possibilidade viável de felicidade para a maioria da população (eu que o diga). Mas ah, já ta na hora da gente decidir absolutamente as nossas vidas e colocá-las no piloto automático?

Não sei. Isso não envolve só saber, ou achar, que sabe, o que quer da sua vida pro resto da vida. Isso envolve um lance que eu não sei se é Brasília ou aplicável a cidades pequenas, ou uma soma das duas coisas. Envolve planos muito fixos e poucas saídas de curso.

Lembro que quando eu juntei aquela galera lá em casa pra jogar Rock Band, o Igor falou que achou fera e tal, “mas não tenho dinheiro pra isso”. Com um carro zero, comprado com o dinheiro dele, estacionado na frente da casa. Como não tem? Eu não tenho! É tudo uma questão de prioridades. Não estou dizendo que videogames devam ser a prioridade (o próprio Igor comprou um Xbox meses depois), mas putz, eu vejo às vezes o povo se matando pra pagar prestações de casa, ou de carro, ou juntando dinheiro para sei lá o quê. É bem verdade que eu tenho a minha casa, mas passei a maior parte do tempo aqui em São Paulo alugando um apê, e o que pagava lá é quase o condomínio aqui. Enfim, eu também estou muito longe de ser um exemplo de responsabilidade financeira, mas feito esse parênteses todo, não me sobra muito dinheiro mas vou ao Starbucks toda semana, como em algum restaurante fera, experimento alguma receita diferente no Mercadão e compro presente pros amigos e jogos pra mim. Tudo isso somado dá menos que a parcela de um carro ou uma casa. Quando eu tiver dinheiro eu compro alguma coisa maior, não quero sacrificar minha vida no auge, aos 27, para o “futuro”. Que diabos é o futuro senão o presente daqui a pouco?

Agora vocês devem estar esperando a hora que eu falo que São Paulo é bem melhor para fazer tudo isso, que é a cidade dos sonhos – todo mundo sabe o que me fez me apaixonar por esse lugar. Mas não, uma vida cheia de possibilidades depende muito menos do lugar que da pessoa. Foi muito interessante vir pra cá para na volta ver a cidade as pessoas com um olhar de estrangeiro que é fundamental. Acho que viver em outra cidade por um tempo é quase essencial para uma melhor compreensão das coisas.
Mas então, tudo isso é pra dizer que às vezes eu sinto uma certa preocupação com minhas pessoas amadas em Brasília. A maioria leva a vida a sério demais e esquecem sonhos de anos atrás achando que já estão ficando velhas. A vida não pode ser só trabalhar ou estudar pro cursinho durante o ano para ir ao Rio no Revéillon, ou ao Nordeste no Carnaval. Largar tudo e ir pra Índia estudar Ioga ou ir à África fazer trabalho voluntário pode ser uma possibilidade, tirar duas semanas pra fazer porra nenhuma ou um mochilão na América do Sul é outra. Ter um emprego fixo e ultra certinho não quer dizer que você não pode pesquisar independentemente uma pauta que dá na sua telha (eu vendo a matéria aqui, se alguém quiser), estudar neurociência ou manter um blog bem feito sobre o que quer que seja. Há mil formas de fazer a reputação e se realizar. Há cada vez mais, na verdade. Eu gosto dos meus amigos por cada uma de suas peculiaridades, e temo quando eles começam a ficar parecidos. Todo esse discurso obviamente não serve para todos, é fácil perceber.

Mas acho que nos cobramos demais muito cedo e esquecemos de coisas menores, mas mais fundamentais. E, bom que se diga, normalmente as coisas fundamentais envolvem pessoas fundamentais. Eu tenho a sorte de ter uma segunda família aqui, pessoas que eu amo e cuidam umas das outras, e uma espécie de soulmate pra qualquer hora, filme ou piada. Há pessoas novas que chegam e dão um ar novo, e renovam a minha empolgação pela metrópole. Mas temos de cativá-las.

Prometo que vou editar isso antes de mandar, sei que tá grande (você que chegou aqui certamente pulou algumas partes). It's a work in progress.

Em resumo: Life is short, seize the day.